terça-feira, 12 de abril de 2011

Cf - 2011 - A atualidade da advertência aos primeiros pais no paraíso (Gn 3, 1-24)


111. Se por um lado, o progresso científico e econômico, político e social da modernidade trouxe contribuições para o bem da humanidade, de outro introduziu muitas situações que atentam contra a vida em sua dimensão planetária. Pois, os detentores do poder quiseram comer da árvore do bem e do mal, utilizando de modo destrutivo dos bens do planeta, e chegamos ao ponto em que as condições para a vida se encontram seriamente ameaçadas, com o efeito estufa e as mudanças climáticas.

112. Nunca como hoje, os frutos desta árvore da vida se mostraram ao mesmo tempo mais fascinantes e mais ameaçadores. As ameaças não vêm evidentemente das ciências e das tecnologias consideradas em si mesmas. Essas podem se constituir em instrumentos preciosos para se desvendar e melhor usufruir das maravilhas da criação. As ameaças vêm das ideologias e do espírito de dominação que muitas vezes marcam certos segmentos do denominado meio científico, e que pela mídia são assimiladas inclusive pelas multidões que absorvem este espírito através dos inúmeros meios de comunicação. A arrogância e a prepotência transparecem, antes de mais nada, em certas afirmações categóricas feitas em nome das ciências, mas que no fundo não passam de meras hipóteses, ou no máximo de teorias. Enquanto há poucas décadas se presenciava um movimento generalizado de dessacralização, hoje, em pleno século XXI, se percebe um movimento inverso. Em certos setores da sociedade, indo na contramão da história e do princípio básico da cientificidade, a palavra “científico” transformou-se numa espécie de ídolo diante do qual todos devem dobrar os joelhos. Enquanto o princípio da cientificidade aponta para a provisoriedade de todas as conquistas, o cientificismo tende a absolutizar o que, por definição, é relativo e provisório. E, uma vez mais na contramão da história, há grupos que se aproveitam de teorias pretensamente científicas para investir contra a vida e os que defendem sua inviolabilidade desde a concepção até a morte natural.

113. A par da arrogância que transparece no uso e abuso do adjetivo “científico”, causa preocupação a maneira como são anunciadas as promessas de eventuais curas de certas doenças através do avanço das biotecnologias. O tom dessas promessas é tal que levanta sérias dúvidas sobre qual seria de fato o móvel de anúncios sensacionalistas. Seria expressão de uma concepção reducionista e até certo ponto ingênua da complexidade dos mecanismos da vida, mormente da vida humana? Seria a tentação de ocupar destaque na mídia para garantir um lugar de honra no panteon outrora ocupado pelos deuses pagãos? Por trás de tantas promessas não se esconderiam interesses escusos, seja na linha de obter financiamentos públicos para laboratórios privados, ou então até mesmo para usufruir de lucros oriundos da exploração de um povo sofredor? Por trás desta venda de ilusões não se esconderiam até segundas intenções de caráter mais político-ideológico, no sentido de distrair as atenções do povo das verdadeiras causas de seus sofrimentos imediatos e que se localizam nas estruturas econômicas e sociais que impedem uma grande maioria de se beneficiar dos benefícios do progresso?

114. Assim, o apossar-se dos frutos da árvore da vida está significando caminhos para o apossamento das pessoas e da natureza, sem avaliar as consequências deste ato e sem considerar uma justa hierarquia de valores que deve reger as relações das pessoas entre si, com a natureza e com o Criador.

115. Desse modo, este pecado do princípio, é um pecado atual, que permanece aberto e se atualiza, especialmente quando as pessoas se deixam conduzir pelo anseio e desejo de dominação e subjugação do outro, de modo violento, causando destruição e morte, como atualmente no sistema estruturador de nossas sociedades. Este pecado diz que os homens e mulheres quiseram assumir prerrogativas divinas e pela força, dominar o mundo e subjugar os demais seres, em uma guerra social e ecológica que leva inevitavelmente à morte.

116. Quando o ser humano se comporta como Deus, fazendo o que deseja, sem respeitar os limites, ele fica só (constatam que estão nus), não se relaciona de modo justo e edificante com Deus, pois precisa esconder-se dele, ou com seu semelhante, pois acusa a mulher de ser a responsável por seus erros, e nem com os seres vivos da natureza, pois é expulso do paraíso. A desordem surge quando homem e mulher pretendem conhecer o bem e o mal com a intenção de se tornarem divinos (lembremo-nos das palavras da serpente à Eva: de modo algum morrereis, mas sereis como Deus [cf. Gn 3, 5], e assim, dirigir toda criação conforme suas leis e critérios, sem nenhum respeito pelas normas que presidem o justo e solidário relacionamento humano com o universo.

117. Diante de nossas problemáticas com o meio ambiente, se faz oportuna a leitura em chave ecológica da denominada queda dos primeiros pais no paraíso (Gn 3, 1-24). E podemos reconhecer no que Deus disse a Adão e Eva uma advertência com implicações ecológicas: “Mas da árvore do conhecimento do bem e do mal não deves comer, porque, no dia em que dela comeres, com certeza morrerás” (Gn 2, 17). A riqueza que os seres humanos têm à disposição se reveste igualmente de um princípio de responsabilidade.

118. Esse enunciado bíblico indica ao homem e à mulher que podem usufruir dos bens do jardim, desde que mantenham a ordem, que é de caráter superior e aponta para a justiça e a solidariedade, dentro da terra em vista da coletividade. A não observância desta advertência implica em morte, o que é atualíssimo. Comer da árvore não recomendada significa que as pessoas se fazem dominadoras e instalam um sistema destruidor, e na condição de senhores e senhoras do bem e do mal, acabam destruindo tudo, inclusive a si mesmos e instalando um conflito no lugar de uma vida solidária.


Fonte: Fonte: Texto Base da CF 2011
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