quinta-feira, 18 de agosto de 2011

“A vida Beneditina missionária á luz do mistério de Maria”


(Extraído de Cuadernos Monásticos 131 (1999) 431-434 – Por LILIANA SOLHAUNE, OSB)
A autora é monja do Mosteiro Beneditino Nossa Senhora do Paraná (Aldeia Maria Luisa. Entre Rios.
Argentina). O presente artigo é o texto do “testemunho” apresentado por sua Comunidade no Congresso Missionário (COMLA 6 – CAM 1), Paraná (Entre Rios, Argentina) de 28.09 a 03.10.1999.

Como monja beneditina quero apresentar-lhes nossa vocação e missão, que é um modo particular de viver a identidade cristã dentro da Igreja. Compartilhamos com todos vocês uma mesma herança, uma mesma benção: a de termos sido escolhidos por Cristo para ser santos, participantes da vida divina. E trazemos inscrito no nome  beneditinos/beneditinas essa vocação original, batismal, própria dos cristãos: a de ser benção em meio ao mundo. Benção que se diversifica na riqueza de múltiplos carismas particulares dentro da Igreja.

Quero compartilhar hoje com vocês quatro aspectos do particular carisma beneditino, à luz dos mistérios marianos; à luz dos mistérios gozosos da vida de Maria, a  bendita por excelência e a primeira contemplativa. Quatro aspectos próprios da vida monástica beneditina, que são outros tantos canais de benção e focos de missão: a oração, a vida em comunidade, o trabalho e a hospitalidade.

Fomos chamadas, em primeiro lugar, a uma vida de  oração. Por isso suplicamos a cada dia, com os olhos em Maria orante, que nos ensine a escuta atenta da palavra na lectio divina, na leitura diária da Bíblia. Pedimos-lhe que saibamos guardar e meditar no coração as coisas de Deus: não somente sua Palavra, mas também os acontecimentos através dos quais Ele se manifesta. Pedimos-lhe que nos torne contemplativas, ou seja, capazes de ver as coisas como Deus as vê, através de seu olhar infinitamente compassivo e misericordioso. Pedimos que saibamos dar o  Sim de Maria à vontade de Deus que se evidencia nas exigências concretas da vida cotidiana, porque sabemos que essa obediência amorosa e livre à sua vontade é a oração que mais lhe agrada. Pedimos que possamos cantar com Maria o Magnificat, esse hino que louva as maravilhas que o Senhor faz em nosso meio.

Essa dimensão de louvor é concretizada sobretudo na  oração litúrgica que fazemos,reunidas nessa pequena igreja que é a comunidade, intercedendo por todos os homens. Nenhum acontecimento da vida, seja em nosso âmbito doméstico ou no cenário nacional ou internacional nos deixa indiferentes.

A monja leva o universo e a humanidade no coração e ali, com Jesus e Maria, os coloca nas mãos amorosas do Pai. Há um salmo que diz: Cantem ao Senhor um cântico novo, cante ao Senhor a terra inteira (Sl. 95(96). Isso fazemos nas distintas horas do dia: pela manhã, à tarde, à noite. E vamos deixando que os salmos, os hinos e os textos da Escritura nos vá penetrando o coração, para abrandar sua dureza. Porque a conversão é nosso primeiro compromisso missionário. 

A conversão que faz de nossa vida um cântico novo, uma benção que se eleva agradecida ao Pai. Em segundo lugar, São Bento nos indica como caminho de santidade uma intensa vida de comunidade que é  ocasião de entrega desinteressada ao amor fraterno. Convida-nos à comunhão, atitude missionária por natureza. Como isto é um dom, nós o pedimos a cada dia, olhando a Maria que, em Belém sustenta em seus braços um menino pequeno e frágil. Pedimos a Maria que sustente nos braços nossa Comunidade, como neles sustenta o Santo Menino no qual Deus se encarnou, porque sabemos que Ele quer continuar nascendo hoje entre aqueles que estão reunidos em seu nome, para voltar a nascer e crescer em sabedoria e graça, ensinando-nos, como já fazia desde criança no Templo, a nos ocuparmos das coisas de seu Pai. D´Ele aprendemos avencer a antiga tentação de nos crermos doutores da lei, para cultivar a simplicidade da vida verdadeira, na qual cada um se torna benção para os demais. A Eucaristia, que nos congrega e alimenta diariamente, torna possível esse milagre cotidiano, que acontece nesse Templo que é a comunidade eclesial. Uma Comunidade monástica quer ser um testemunho concreto e palpável de que a paz é possível e de que  a paciente construção cotidiana do amor entre irmãos muito diferentes entre si e de culturas distintas é possível.

O terceiro meio através do qual a vida monástica se torna missionária é o trabalho humilde e responsável.  Trabalhar para viver modestamente, para ganharmos o pão nos limites de uma vida austera, já que é próprio dos monges viver do trabalho de suas mãos. 

Queremos viver o trabalho como uma benção, apesar do peso e da fadiga que acarreta, apesar da incerteza diante das dificuldades da subsistência diária; por isso olhamos para o mistério que cerca a Casa de Nazaré. Temos a certeza de que nada do que nela viveram Jesus, Maria e José, nem o menor gesto, deixou de ser fecundo para a salvação do mundo. Porque tudo ali brotava do dinamismo de um amor  sem limites: o que anima a mesma família trinitária. Olhando a Sagrada família tomamos consciência da dimensão missionária de nosso trabalho.  Quando o assumimos com responsabilidade, como resposta a uma  missão, numa obediência livre e cheia de alegria, que somente a participação na Cruz de Cristo torna possível, então o trabalho se torna missionário: misteriosamente bendiz ao mundo, é causa de libertação e conversão para muitos. Também para nós. E nos prepara para perseverar num trabalho maior: o trabalho de viver a vida sabiamente, segundo o destino da glória para a qual fomos feitos. Glória que se antecipa ainda nesta vida, se nos deixarmos trabalhar pela benção que o Pai dispensa constantemente a seus filhos através do Filho. No Mosteiro aprendemos a nos despojar da ambição do poder, da competitividade, do desejo de dominar, de sermos superiores aos demais. Esses perigos, escondidos em todo homem, também nos ameaçam e, ao vencê-los pelo poder de Jesus e um trabalho de crescimento humano e espiritual para  obter a verdadeira liberdade de coração, nos tornamos causa de benção para nossos irmãos. Se através de uma vida centrada em Cristo, em sua Sabedoria da Cruz, estamos indicando aos homens a estrela que guia nosso caminhar, então toda nossa vida é um trabalho missionário.

A  hospitalidade é outro tradicional carisma beneditino. Outro dom que devemos suplicar a Deus e cultivar. No gesto de acolhida ao hóspede, ao peregrino e ao pobre e humilde, seatualiza o mistério da Visitação, aquele encontro gozoso entre Maria e Isabel. Nesse encontro se esconde a imensidão do mistério de um Deus que quis vir ao encontro de nossa humanidade para nela se hospedar.

Ao mosteiro vem muita gente com fome e sede de Deus e também com problemas, sofrimentos, com uma grande necessidade de um ouvido atento e tempo disponível num ambiente de paz, serenidade e presença de Deus. A hospedaria monástica nos permite compartilhar com eles os bens espirituais, sobretudo a Liturgia: nela a benção de Deus se comunica plenamente. Também estabelecemos uma relação pessoal que nos introduz no dinamismo missionário da Igreja: misteriosamente, tanto nossos hóspedes como nós vamos nos reconhecendo como hóspedes em Cristo, e por obra do Espírito Santo, do Pai infinitamente hospitaleiro e misericordioso. Em seu amor sempre criador nos reconhecemos evangelizados e evangelizadores.

Finalmente, coloquemos nas mãos de Maria  este dom da vida monástica – esta benção que herdamos – para que ela a apresente, como a Jesus no Templo, numa oferta agradecida que é fonte de toda benção.

(Tradução por uma Oblata do Mosteiro da Transfiguração – Santa Rosa – RS).
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